sexta-feira, 20 de junho de 2014

Esclarecendo

A minha entrada anterior, “Carta a amigos de esquerda”, suscitou críticas e interrogações, principalmente no Facebook, que bem merecem algum esclarecimento da minha parte. É meu dever, porque certamente fui eu que não consegui ser mais claro, como verifico em segunda leitura. Para facilitar a compreensão desta revisão autocrítica, numerei os parágrafos do texto anterior. Introduzi também algumas adendas clarificadoras.
Começo pela questão semântica, sempre significativa. Como disse no parágrafo 1, não quis que a discussão ficasse enredada na eterna questão se o PS é ou não de esquerda e que pode afectar a participação de socialistas num novo movimento, a nível individual ou por intermédio de organizações sociais a que pertençam. 
Com isto, gerei ambiguidades, tanto mais importantes quanto a minha proposta inclui dois campos de actuação, num dos quais, o do movimento popular unitário, não vejo como inserir o PS, ficando só, coerentemente, a esquerda à esquerda do PS (EePS, talvez a designação mais pragmática). No outro, o da luta a curto prazo para a substituição deste governo, gostaria de assistir a uma convergência mais ampla, de âmbito parlamentar e governativo, entre o referido movimento popular unitário e o PS, se preenchidas condições mínimas de actuação conjunta
Escrevendo “termo esquerda, tomado como abrangendo o PS, os partidos à sua esquerda e todas as forças não partidárias com actuações convergentes com as lutas políticas nesse campo”, fui eu próprio a tornar imperceptível a distinção entre os dois planos de unidade ou convergência que defendo. Aliás, simbolicamente, seria melhor usar o termo unidade para o movimento centrado à EePS (mais as forças sociais que participariam) e o termo convergência para o entendimento desse movimento com o PS, para fins eleitorais a curto prazo.
Apesar da ambiguidade de terminologia, manifesta também, por exemplo, tnos parágrafos 12 e 25 e pela referência ao PS no parágrafo 11, afirmo no parágrafo 6 que a unidade estratégica, verdadeiramente transformadora a prazo, deve ser entre os partidos não sociais-democratas (donde, a EePS).
Como disse atrás, o parágrafo 12 é importante por resumir a minha ideia dos dois níveis de relacionamento: “temos de ver toda a questão de alianças em dois planos, o estratégico e o de curto prazo, neste ciclo eleitoral. O estratégico é, forçosamente, mais exigente, devendo conjugar a abertura ao debate, a democracia e a fraternidade de relações entre grupos e a flexibilidade de referências com um programa comum coerente. A meu ver, isto será tanto mais fácil quanto maior for o envolvimento de organizações sociais e comunitárias, grupos de cidadãos e movimentos não partidários, a constituir, com os partidos, um movimento popular e patriótico.” Todavia, a referência final a partidos, sem especificação, prejudica gravemente a coerência do texto.
Também a proposta objectivada, no parágrafo 25, volta a omitir a qualificação dos partidos, mas depois do que escrevi antes (parágrafos 15 e 16), e também pelas alíneas programáticas (muito gerais, que é o que me compete), parece-me claro que não estava a pensar incluir o PS nesta unidade estratégica.
Uma crítica que me foi feita merece bem um esclarecimento: “Quanto à inevitabilidade que o João vê de se fazer uma discussão com este P"S", convido-o a olhar para Espanha(s), para Inglaterra, para França, para a Grécia, etc. Não vale votar antecipadamente. E não conclua apressadamente que não é a luta de classes que fará mudar o rumo da História. Com estes P"S"s que anotei não há "esquerda" que resista.” 
Relembro o que escrevi. Ao contrário dos casos que o meu crítico menciona, e que mais cedo ou mais tarde demonstrarão o que valem (a começar pelo novo PS grego Syriza), eu referia-me ao plano estritamente eleitoral e a curto prazo, em que é minha opinião que a manutenção da direita é um desastre e em que se deve fazer o máximo para um governo dos partidos da actual oposição. Pela razão muito simples de que, para já, numericamente não há alternativa. Simplesmente, a história ensina que, depois de uma dificuldade não resolvida, é ganhar forças e seguir em frente. O que bem pode acontecer quando tudo indica que uma alternativa “à” esquerda não será uma alternativa “de” esquerda”.
Finalmente, outra crítica. Caracterizei o proposto movimento como popular e patriótico, termo que gera sempre alguma polémica. É claro que não uso o termo como o fazem os anti-internacionalistas, os xenófobos, os que se deixam alienar pelas grandiosidades míticas da nossa história, do fado e do futebol. Uso o termo como identificado com soberania e com a luta pela defesa dos interesses do povo português (cá está uma noção nacionalista a-classista e reaccionária?…) quando confrontado, como agora, com a ofensiva do capital que, este sim, é claramente internacionalista.
P. S. – Como se compreende, fico muito satisfeito com a disponibilidade unitária manifestada pelo Bloco e, separadamente, pelo PCP. Não sou dos que, logo à partida, consideram morta esta perspectiva, que defendem a capelinha sobre a prioridade da iniciativa ou começam com purismos ideológicos, respeitáveis no âmbito do partido mas dificultadores da unidade.

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